Em uma época de avanço acelerado no uso da Inteligência Artificial (IA) na vida cotidiana, a discussão sobre o direito do uso da imagem de pessoas após sua morte ganhou notoriedade nos últimos meses. Um comercial envolvendo a recriação da cantora Elis Regina e a alteração no testamento da popstar Madonna, que proibiu o uso de hologramas após sua morte, chamaram a atenção da sociedade para um tema que já chegou aos Cartórios de Notas do país: as escrituras sobre direitos digitais.
Conhecidos tecnicamente como Escrituras Declaratórias ou Diretivas Antecipadas de Vontade (DAVs), os atos vêm se tornando cada vez mais comuns nos Tabelionatos brasileiros, e envolvem a proteção de direitos que vão desde o acesso às senhas e códigos de redes sociais, muitas vezes de canais de influenciadores monetizados por plataformas digitais, até pessoas que desejam preservar os direitos de voz ou imagem em caso de algum acontecimento inesperado. Nos últimos três anos foram três atos desta natureza e um nos primeiros sete meses de 2023.
“Ao formalizar suas instruções e preferências detalhadas quanto ao uso de seus dados digitais em uma DAV, a pessoa pode se proteger legalmente e até mesmo definir como deseja que sua voz e imagem sejam tratadas no contexto da IA.” Explica o presidente do Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Norte (CNB/RN), Sérgio Procópio. “E o notário desempenha um papel crucial nesse procedimento, atuando como um profissional qualificado para garantir a autenticidade, a validade jurídica e a conformidade das DAVs com as leis vigentes, assegurando que as diretrizes expressas sejam claras, precisas e legalmente executáveis, mesmo após o falecimento da pessoa”, complementa.
O assunto é tema também de um Projeto de Lei de autoria do senador Rodrigo Cunha (Podemos/AL), que busca disciplinar e estabelecer regras para a utilização dessas imagens e recursos, principalmente quando se tratar de pessoas já falecidas. De acordo com o PL 3.592/2023, o uso da imagem de uma pessoa falecida por meio de IA só será permitido com o consentimento prévio e expresso da pessoa em vida ou dos familiares mais próximos. A proposta ainda determina que essa permissão deve ser obtida e apresentada de forma clara, inequívoca e devidamente documentada, especificando os objetivos a serem alcançados com o uso das imagens e dos áudios a serem utilizados.
Como fazer
Para realizar uma DAV, o interessado deve comparecer em um Cartório de Notas com os seus documentos pessoais. O ato também pode ser realizado de forma eletrônica, por meio da plataforma digital nacional www.e-notariado.org.br. Nesta situação, o cidadão escolhe o Cartório de Notas de sua preferência para solicitar o serviço, em seguida é agendada uma videoconferência com o tabelião de notas e a escritura é assinada eletronicamente, por meio de um certificado digital gratuito que pode ser emitido pela mesma plataforma.
Já o testamento público é o documento pelo qual uma pessoa (o testador) declara como e para quem deseja deixar seus bens após a sua morte. Para realizar o ato é necessária a presença de duas testemunhas que não podem ser herdeiras ou beneficiadas pelo testamento, além dos documentos de identidade de todas as partes, requerentes e testemunhas. A presença de um advogado é opcional. O documento pode ser alterado e revogado enquanto o testador viver e estiver lúcido, e terá validade e publicidade somente após a morte do testador.
Fonte: Tribuna do Norte